sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Singular plural

Contigo, apodrecemo-nos.


        deita os dejectos pela sanita. 


                   como convém. 

Motricidade II

Gostava que esta dor que me dói no peito parasse de doer.
Mas esta dor que me dói no peito só dói à noite.
E esta dor que me dói no peito só dói à noite porque me dói na consciência e não no peito.
Mas a dor continua lá e o peito também e a consciência tam-pouco se mostra. É por isso que me dói no peito e não no outro sítio.
Mas esta dor que me dói no peito e que não é do peito não cessa com químicos e eu queria tanto que cessasse.
Mas a dor que me dói no peito não pode parar de doer se não a enfrascarem como deve ser, como dor de peito que é não ser dor de peito.
Mas sabem lá eles curar a dor de peito que não é do peito e tão só lhes sei dizer isto: que é uma dor que dói no peito mas que não é uma dor do peito.
Gostava que se apaziguasse esta dor, mas esta dor jamais se apaziguará que tenho a consciência  amordaçada a mim.




- da insuportável dor que se me crava no corpo de nem a consciência poder ser livre de não ser consciente.-




domingo, 5 de janeiro de 2014

Aos ratos

Do desespero de ter algo para dizer e não saber.
Do desespero de ter de ter algo para dizer.
Do desespero de pisar o chão e saber que o piso.
Do desespero desta consciência que me arde e me estende morto-vivo na terra que, a seu tempo, me há de engolir. Mais morto do que vivo ou nem isso. Não sei.
Do desespero de não saber.
Do desespero do nada.
Do desespero da imensidão obscura do absoluto que é nada.
Do desespero desse espaço vazio. Do vazio em vão. Como tudo.
Do desespero das impossibilidades e das suas possibilidades absurdas.
Do desespero desse absurdo.
Do desespero de estar desesperada.
Do desespero que aquela terra, também a seu tempo, há-de silenciar.





- Dura, enquanto te podes. Dura muito, dura sempre, porque só duras enquanto te durares. -